O centenário de Joaquim Nunes Rocha
* Prof.
Izaias Resplandes de Sousa
Cem anos se passaram. Quanta vida!
Quanta memória! Quanta história!
Eis que hoje, com a responsabilidade do
Instituto Histórico e Geográfico de Poxoréu, venho saudar, in memoriam, o Dr.
Joaquim Nunes Rocha, de quem muitos puderam contar como amigo e companheiro na
política, nas artes e na cultura de modo geral; muitos outros como benfeitor e
patrono de suas causas judiciais; e outros ainda como patriarca de uma plêiade
de nomes que honram sua memória e sua história.
Rochinha veio de Goiás, da terra das
preciosas esmeraldas do Anhangüera, para ser em Mato Grosso um dos construtores
da cidade de Poxoréo, nossa eterna Capital dos Diamantes. Herdou a tenacidade e
a firmeza das pedras preciosas, conservando a lucidez e sendo sempre um homem
brilhante e ativo em todos os seus 85 anos de vida, advogando as causas dos
mais pobres e menos favorecidos da fortuna, mediando, assim, os litígios
sociais de sua gente.
Nasceu em 07 de junho de 1916, em
Tocantinópolis, Goiás, hoje, Estado de Tocantins, filho do Sr. Francisco
Ferreira Nunes e de Dona Maria André da Rocha, mas foi criado nas terras de São
Pedro, onde nasceu Poxoréu, pelo Sr. Barnabé Francisco dos Anjos, seu
padrasto, homem de notórios valores éticos e morais, para onde veio quando
tinha apenas nove anos de idade. São Pedro, nessa época era o epicentro da
ocupação social e o mais novo eldorado da fortuna e dos bamburríos da região.
Ali sua mãe consolidaria a relação com o padrasto, com quem ainda teria mais
três filhos: João Francisco dos Anjos, Zeli Rocha dos Anjos e Wilson Francisco
dos Anjos.
Viveu em São Pedro até 1927, quando
ocorreu um grande incêndio naquele povoado. E então sua família mudou-se para a
corrutela de Morro da Mesa, a futura cidade de Poxoréu, onde adquiriram terras.
E foi em Poxoréu que Rochinha cresceu, se habilitou e se notabilizou como
guarda livro, farmacêutico, advogado e político.
É de destacar que “Rochinha foi um
forte até a morte!” Inquiridor irrequieto, persistente, metódico, disciplinado
e muito inteligente, ele sempre soube como conduzir. E por isso foi, com
certeza, um líder durante toda a sua vida. Como político amou a terra
mato-grossense, dando-se por ela em diversos mandatos como suplente de senador,
deputado federal e estadual, vereador e prefeito de Poxoréu. Inegavelmente, ele
foi o maior e mais importante líder político que esta terra poxorense já
produziu e que por ela se dedicou com tamanha intensidade. Aqui ele não veio
passear, não veio visitar. Ele veio para ficar e aqui estará para sempre, nos
corações de seus amigos, de seus seguidores políticos, de seus descendentes e
até mesmo de seus adversários, que irão se lembrar dele e de sua lealdade nas
disputas pelo poder.
Segundo o prof. Gaudêncio Amorim, “não
se tem conhecimento que Nunes Rocha tenha tratado um adversário político como
inimigo pessoal, mas principalmente como um potencial aliado futuro e, neste
caso, o valor que dispensava e o respeito que a ele hipotecava até podiam
revelar uma estratégia política, mas era mais do que isso. Rochinha venerava o
gênero humano, defendia e respeitava as liberdades individuais de tal forma
que, se desejasse tê-los consigo numa ideia ou num projeto, cabia a ele
conquistar pelo instrumento da persuasão”.
O advogado e analista político Dr.
Pedro Lima, em artigo publicado no Diário de Cuiabá, poucos dias após a morte
de Nunes Rocha, assim escreveu: “Com a
morte de Joaquim Nunes Rocha, Mato Grosso perdeu uma reserva moral, a classe
política perdeu uma referência, e a região dos garimpos, o sul do estado -
antigo leste mato-grossense -, um dos homens que soube representar com
dignidade aquele povo pioneiro que com seu trabalho artesanal, inicialmente nas
lides dos garimpos de diamantes e, posteriormente, na pecuária e agricultura se
constituiu na sentinela avançada do desenvolvimento de Mato Grosso”. E
continuou: “Rochinha, como seus amigos e adversários o tratavam, fez parte
daquela velha guarda de políticos sérios, dedicados ao partido e fiéis aos
amigos. Disputou várias eleições; tinha uma irresistível atração pelas urnas.
Perdeu e ganhou. Soube se conduzir com dignidade nas vitórias e com altivez nas
derrotas. Nunca foi seduzido a abandonar a sua querida UDN pelas promessas,
propostas ou benesses fáceis do poder. Lutava por esse poder no seu partido e
ao lado de seus correligionários. Não conheceu a estrada dos pusilânimes que a
um aceno jogam suas biografias no lixo da história em busca de interesses
pessoais e mesquinhos, como infelizmente se tornou prática nos tempos atuais”.
Já o Pr. Abel Azambuja, da Igreja
Assembleia de Deus, na qual congregava por ocasião de sua morte, disse que
Rochinha escrevera um documento onde declarara que "depois de percorrer
várias igrejas e de examinar várias doutrinas, finalmente havia encontrado o
caminho na pessoa de Jesus". Assim, enquanto no meio evangélico ele
encontrou o caminho para os céus, na terra, ele foi o patriarca de uma família
que tem feito as coisas acontecerem neste país. Junto com seus sete filhos: Lindberg
(ex-prefeito de Poxoréu), Louremberg (ex-deputado-federal e ex-senador da
República), Lindemberg (médico), Mary Lindsey (sua única filha), Joaquim Nunes
Rocha Filho (agropecuarista), Sílvio Romero (advogado) e Benedito César (sociólogo
e historiador), ele escreveu muitas e muitas páginas na história do Brasil,
razão porque sempre estará vivo na nossa memória.
Rochinha sonhou, pensou e projetou. Pensar o
futuro é uma questão de responsabilidade. Principalmente quando esse é o futuro
da nossa cidade. Segundo seu filho Lindberg Ribeiro Nunes Rocha, seu pai sempre
proclamava nos discursos que fazia, os seus sonhos de ter uma Poxoréo com
avenidas largas e floridas, com espaço para que a juventude pudesse viver e ser
feliz. Ele foi um crente extremado que sempre acreditou na possibilidade de seu
povo ser feliz. Com certeza foi no seu exemplo que Lindberg aprendeu que
"para se administrar uma cidade, antes de tudo é preciso amá-la", o
que também lhe garantiu vários mandatos como administrador de Poxoréu.
Isso era mesmo verdade! Ainda
está bem vivo em minha mente as palavras de seo Rocha sobre os seus sonhos de
felicidade para a cidade de Poxoréo, quando disputou a Prefeitura de Poxoréo em
1992. Ele disse e eu gravei para a história: “Com muita satisfação eu me dirijo
ao povo de Poxoréo, para que nos ajudem nessa peleja, porque essa peleja é uma
peleja legítima a defender os interesses daqueles que vivem nessa região. Nós
estamos disputando o cargo de Prefeito Municipal, não por vaidade.
Absolutamente! Não por aventureirismo. Nós estamos disputando, porque
verificamos que dispomos das condições necessárias para trazer a esta
coletividade o dinheiro que seja necessário à construção de obras, à abertura
de outras atividades, à instalação de novas empresas que tragam os benefícios
ao povo, que tragam a felicidade desta região. Dessa forma, nós nos encontramos
na condição de carrear para a nossa gente, toda sorte de benefícios para
assegurar a felicidade do nosso povo e o engrandecimento da nossa cidade”. Ao
finalizar seu discurso, ele disse: “Eu estou oferecendo um prêmio, eu
estou oferecendo um serviço, estou oferecendo os meus conhecimentos nas últimas
décadas da vida. Quero trazer isso como prêmio para o meu povo, para minha
gente, trabalhando, conseguindo recursos, encaminhando estudantes,
conseguindo o aprimoramento do ofício daqueles que laboram aqui dentro de
nossas fronteiras”. Ele se doou por inteiro ao povo de Poxoréo.
Rochinha foi um grande intelectual. Membro da UPE - União Poxorense de
Escritores, ele escreveu vários artigos que foram publicados em diversos
jornais. Ao lado de João José Freire, Joaquim Dias Coutinho, foi um dos
fundadores do Jornal Correio de Poxoréo, no qual registrou muito do seu
pensamento. Mas a sua sede pela cultura e pelo conhecimento nunca foi saciada.
Pouco antes de sua morte, ele esteve em minha casa para conversar comigo.
Ele sempre me procurara para tratar sobre assuntos profissionais e eu pensava
que nossa conversa daquele dia versaria sobre a pauta costumeira. Mas não foi
assim. Ele puxou da memória a história e conversamos durante mais de hora sobre
diversos assuntos da cultura geral. E dias depois, em nossa última conversa por
telefone, ele me solicitou que pesquisasse e o informasse sobre quem fora o
filho que Júlio César teve com Cleópatra, quando andou lá pelas bandas do
Egito. Infelizmente não pude passar-lhe a informação, pois logo ele adoeceu e
foi em busca de tratamento especializado na Capital. Daniel, seu neto, disse
que guardaria do avô, o seu o último sorriso. De minha parte, sempre guardarei
dele, como última lembrança, esse seu interesse apaixonante pelo conhecimento,
pelo qual me inspiro a continuar buscando as respostas para os novos problemas
que a atual era do conhecimento irá desafiar-nos.
Joaquim Nunes Rocha faleceu em 20 de
outubro de 2001.
No dia seguinte eu registrei: Até breve,
Rochinha! Não te daremos um adeus, mas um até breve, na certeza de que logo nos
encontraremos na eternidade dos céus, onde os dias não são contados. Que sua
dedicação e seu amor por esta terra doce e amada chamada Poxoréo, continue
sendo uma inspiração para aqueles que continuarem a sua trajetória no governo
deste Município e deste Estado. Seja também nosso o "obrigado" que
Pe. Pietro Melesi, da Missão Salesiana de Mato Grosso lhe fez postumamente.
Obrigado, de coração, pelo seu exemplo concreto de liderança.
Ter sido um dos amigos de Rochinha
será sempre uma honraria para todos que tiveram tal privilégio. Nós nos
sentimos honrados nesse sentido. E queremos dizer como nossas últimas palavras
nas comemorações desse centenário de seu nascimento, que haveremos de envidar
todos os esforços para continuar a sua luta pela felicidade de Poxoréu.
Que Deus nos ilumine a todos!
* Izaias Resplandes de Sousa é
advogado, professor e escritor mato-grossense. É membro da União Poxorense de
Escritores e do Instituto Histórico e Geográfico de Poxoréu, MT.