O Pe. Amaro, personagem do livro “O Crime do Pe. Amaro” (Eça de
Queiroz), ao ser julgado pelos seus superiores por envolvimento carnal
com Amélia, fundamentou sua defesa no seguinte argumento: “A igreja que
me ensinou ser padre não me ensinou a deixar de ser homem”; Poderíamos
facilmente, parafraseando o enredo do romance, também afirmar que a
universidade que nos ensinou a ser professores não nos ensinou a ser
psicólogos, psiquiatras, advogados, assistentes sociais, embora também
não omitiram a necessidades de habilidades complementares à vocação
docente.
A experiência que a maioria dos professores têm, no nível da formação
acadêmica, é aquela capaz de apreender teorias, técnicas, didática e
métodos de ensino para, com liberdade, poder mediar a construção (re) de
um conhecimento a serviço da vida na vida de crianças, jovens e
adolescentes. As universidades fabricam os sonhos possíveis, mas não é a
parturiente que ajuda dar a luz necessária para iluminar os caminhos
trôpegos e obscuros à emancipação humana no universo heterogêneo das
salas de aula. Esta é a seara do professor, o mundo real da prática
pedagógica, por vezes, eivado de frustrações.
A sala da aula, em muitas escolas, evoluiu de forma degradante para
colheitas imprevisíveis. O clima de incivilidade, desordem,
desinteresse, indisciplina, desrespeito e atos de delinqüência juvenil
tem exigido dos professores um processo de pacificação da barbárie em
vez de tonificar suas práticas pedagógicas em favor das descobertas que
deveriam saciar a fome espiritual e social dos educandos; A sala de aula
tornou-se o reflexo da grande selva de pedra marcada pela violência
urbana, em muitos casos, caracterizada pela profunda ausência dos pais
na vida dos filhos. Diria os sociólogos que, numa sociedade capitalista e
competitiva como a nossa é assim mesmo, mas qual é realmente o papel do
Estado e o papel da família nessa “nova realidade”?
Muitos professores, movidos pelo senso de humanidade, têm sido exímios
pacificadores da violência nas salas de aula motivando os seus jovens a
preencherem o imenso vazio interior que os imputam para a banalidade e
comportamentos inócuos que, num dado momento, “lampejam de sentido” seus
mundos sombrios. Então, a escola também tem esse papel? Seria esta uma
pergunta similar a qualquer aluno que, de repente se perguntasse: Mas eu
venho para a escola para aprender um conhecimento capaz de alimentar os
meus vazios ou tonificar os meus vazios sem conhecimentos? Seria uma
dádiva milagrosa se essa descoberta se manifestasse, pois, é muito
difícil uma criança, jovem ou adolescente conhecer-se a si mesmo; via de
regra, as pessoas, raramente se autoconhecem.
Por
outro lado, o omissão do Estado no que se refere a oferta de ambientes
sadios, alternativos e complementares, politicamente ético e moralmente
corretos favorece as frustrações juvenis que, sem muitas expectativas,
debandam-se para o consumo de drogas e entorpecentes e à delinqüência
juvenil.
E nas encruzilhadas da profissão, professores se enveredam por caminhos
íngremes de caminhadas inseguras, vítimas de um conhecimento imperfeito
tateando, principalmente, a psicologia e assistência social como
ferramentas minimizadoras de um fenômeno que, provavelmente, não tem
origem na sala de aula, mas nela se deságua.
As atribuições docentes, segundo o art. 13 da LDB (Lei. 9.394/96), não
obstante a abrangência filosófica de algumas escolas, inclusive
públicas, não excede de seis obrigações profissionais das quais, sem
demérito para as demais, destacam duas absolutamente relevantes e
tipicamente imanentes à condição de SER PROFESSOR: “Zelar pela aprendizagem dos alunos” (Inciso III) e “colaborar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a comunidade”
(Inciso VI). Mas vejamos: como zelar pela aprendizagem quando o
epicentro das atenções exige a ação curativa de feridas internas
vilipendiadas no âmago familiar? e como articular com estas famílias, as
quais, geralmente, se fazem mais ausentes na escola do que quaisquer
outras? Então deveríamos tratar das famílias e das crianças ao mesmo
tempo. A escola sozinha? Com que habilidade? Segurança? Conhecimento?
Essa parte, com certeza, não obstante a singular liderança de muitas,
não deve ser a parte que parte da escola, embora, algumas vezes se tem
deparado com a arbitrariedade dos tutores da infância e da adolescência
exigir dela tal heroísmo.
É evidente que a escola precisa, enquanto instituição social, fazer a sua parte: ensinar (construir ((re)) ou mediar o conhecimento).
Mas também é evidente que as famílias, situadas no olho do vulcão,
devem fazer a sua e, principalmente, serem assistidas pelo Estado
naquilo que o poder familiar se mostrou frágil e inoperante, sob pena de
não alcançar o disposto no art. 205 (Cf) “a educação, direito de todos e
dever do estado e da família” alterando a escola, de terreno fértil à
construção do conhecimento para um fardo pesado para se carregar
sozinhos.
Por último é importante considerar que a nenhum educador cabe o direito
de se eximir de suas responsabilidades, mas não cabe a ele nem a escola
ser a “palmatória do mundo” e assumir a transformação social de posse
de apenas uma alavanca, muito menos se deixando embrenhar por atividades
meios e alternativas de outras ciências, quando a ele, basicamente
compete muito e apenas, ENSINAR. Deste propósito, nenhum educador se
afasta, se não lhe faltar liberdade, afinal, as experiências mostram que
os melhores ensinamentos acontecem nos espaços e nas asas da liberdade.
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