quarta-feira, 16 de maio de 2012

Em busca de uma liberdade para ensinar.

                                                                                     Prof. Gaudêncio Amorim
                    O Pe. Amaro, personagem do livro “O Crime do Pe. Amaro” (Eça de Queiroz), ao ser julgado pelos seus superiores por envolvimento carnal com Amélia, fundamentou sua defesa no seguinte argumento: “A igreja que me ensinou ser padre não me ensinou a deixar de ser homem”; Poderíamos facilmente, parafraseando o enredo do romance, também afirmar que a universidade que nos ensinou a ser professores não nos ensinou a ser psicólogos, psiquiatras, advogados, assistentes sociais, embora também não omitiram a necessidades de habilidades complementares à vocação docente.
                   A experiência que a maioria dos professores têm, no nível da formação acadêmica, é aquela capaz de apreender teorias, técnicas, didática e métodos de ensino para, com liberdade, poder mediar a construção (re) de um conhecimento a serviço da vida na vida de crianças, jovens e adolescentes. As universidades fabricam os sonhos possíveis, mas não é a parturiente que ajuda dar a luz necessária para iluminar os caminhos trôpegos e obscuros à emancipação humana no universo heterogêneo das salas de aula. Esta é a seara do professor, o mundo real da prática pedagógica, por vezes, eivado de frustrações.
                   A sala da aula, em muitas escolas, evoluiu de forma degradante para colheitas imprevisíveis. O clima de incivilidade, desordem, desinteresse, indisciplina, desrespeito e atos de delinqüência juvenil tem exigido dos professores um processo de pacificação da barbárie em vez de tonificar suas práticas pedagógicas em favor das descobertas que deveriam saciar a fome espiritual e social dos educandos; A sala de aula tornou-se o reflexo da grande selva de pedra marcada pela violência urbana, em muitos casos, caracterizada pela profunda ausência dos pais na vida dos filhos. Diria os sociólogos que, numa sociedade capitalista e competitiva como a nossa é assim mesmo, mas qual é realmente o papel do Estado e o papel da família nessa “nova realidade”?
                   Muitos professores, movidos pelo senso de humanidade, têm sido exímios pacificadores da violência nas salas de aula motivando os seus jovens a preencherem o imenso vazio interior que os imputam para a banalidade e comportamentos inócuos que, num dado momento, “lampejam de sentido” seus mundos sombrios. Então, a escola também tem esse papel? Seria esta uma pergunta similar a qualquer aluno que, de repente se perguntasse: Mas eu venho para a escola para aprender um conhecimento capaz de alimentar os meus vazios ou tonificar os meus vazios sem conhecimentos? Seria uma dádiva milagrosa se essa descoberta se manifestasse, pois, é muito difícil uma criança, jovem ou adolescente conhecer-se a si mesmo; via de regra, as pessoas, raramente se autoconhecem.
                   Por outro lado, o omissão do Estado no que se refere a oferta de ambientes sadios, alternativos e complementares, politicamente ético e moralmente corretos favorece as frustrações juvenis que, sem muitas expectativas, debandam-se para o consumo de drogas e entorpecentes e à delinqüência juvenil.
                   E nas encruzilhadas da profissão, professores se enveredam por caminhos íngremes de caminhadas inseguras, vítimas de um conhecimento imperfeito tateando, principalmente, a psicologia e assistência social como ferramentas minimizadoras de um fenômeno que, provavelmente, não tem origem na sala de aula, mas nela se deságua.
                   As atribuições docentes, segundo o art. 13 da LDB (Lei. 9.394/96), não obstante a abrangência filosófica de algumas escolas, inclusive públicas, não excede de seis obrigações profissionais das quais, sem demérito para as demais, destacam duas absolutamente relevantes e tipicamente imanentes à condição de SER PROFESSOR: “Zelar pela aprendizagem dos alunos” (Inciso III) e “colaborar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a comunidade” (Inciso VI). Mas vejamos: como zelar pela aprendizagem quando o epicentro das atenções exige a ação curativa de feridas internas vilipendiadas no âmago familiar? e como articular com estas famílias, as quais, geralmente, se fazem mais ausentes na escola do que quaisquer outras? Então deveríamos tratar das famílias e das crianças ao mesmo tempo. A escola sozinha? Com que habilidade? Segurança? Conhecimento? Essa parte, com certeza, não obstante a singular liderança de muitas, não deve ser a parte que parte da escola, embora, algumas vezes se tem deparado com a arbitrariedade dos tutores da infância e da adolescência exigir dela tal heroísmo.
                   É evidente que a escola precisa, enquanto instituição social, fazer a sua parte: ensinar (construir ((re)) ou mediar o conhecimento). Mas também é evidente que as famílias, situadas no olho do vulcão, devem fazer a sua e, principalmente, serem assistidas pelo Estado naquilo que o poder familiar se mostrou frágil e inoperante, sob pena de não alcançar o disposto no art. 205 (Cf) “a educação, direito de todos e dever do estado e da família” alterando a escola, de terreno fértil à construção do conhecimento para um fardo pesado para se carregar sozinhos.
                   Por último é importante considerar que a nenhum educador cabe o direito de se eximir de suas responsabilidades, mas não cabe a ele nem a escola ser a “palmatória do mundo” e assumir a transformação social de posse de apenas uma alavanca, muito menos se deixando embrenhar por atividades meios e alternativas de outras ciências, quando a ele, basicamente compete muito e apenas, ENSINAR. Deste propósito, nenhum educador se afasta, se não lhe faltar liberdade, afinal, as experiências mostram que os melhores ensinamentos acontecem nos espaços e nas asas da liberdade.


Prof. Gaudêncio Amorim. Poeta. Escritor e Compositor filiado a União Poxorense de Escritores - UPE

Nenhum comentário:

Postar um comentário